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quinta-feira, 3 de outubro de 2013

UM VENTO QUENTE E UMA INDIGNAÇÃO: O que Jonas tem a nos dizer?


Jonas era um profeta. Como tal, ele era encarregado de proclamar a vontade de Deus, denunciar os erros de um povo e convocar esse povo ao arrependimento. Ele, com certeza, disse “eis-me aqui” ao seu chamado e estava sempre disposto a comunicar a Israel o que Deus queria, para que sua gente se arrependesse e recebesse o favor do Eterno. Mas ele não esperava que Deus lhe pedisse algo tão injusto.
Para ele, era inconcebível que Deus lhe pedisse para chamar o povo de Nínive ao arrependimento. “Como assim, Deus, profetizar àquele povo cruel?”. Jonas – e o povo de Israel inteiro – odiava o império assírio, do qual Nínive fazia parte. A Assíria era extremamente má: praticava guerra por meio de terrorismo e da devastação ambiental. Os ninivitas eram uma ameaça à segurança nacional de Israel e ao patriotismo de Jonas. Ele queria mais era que o fogo dos céus e a ira de Deus caísse de forma impetuosa sobre aquele povo maldito.
É mais ou menos como se Deus mandasse, atualmente, alguém de Israel profetizar à Palestina ou vice-versa. Mais ou menos como se Deus, num passado mais próximo, tivesse mandado um judeu convocar a Alemanha nazista e o Führer ao arrependimento. É como se Deus mandasse você abençoar alguém que te fez muito mal, alguém que você não consegue e nem quer perdoar.
Eu não julgo Jonas por ter fugido para a direção oposta a Nínive. Acho que, no lugar dele, eu faria a mesma coisa. Abençoar quem me fez mal? Que me traiu, que inventou mentiras sobre mim? Alguém que tem feito “inferno” da minha vida, me perseguido? Não, não, não, Deus, eu quero o seu castigo sobre os meus inimigos, eu quero que o Senhor me honre, quero sentir o sabor de mel da derrota de quem está me fazendo mal!
Mas não foi o amor aos inimigos que Jesus nos ensinou? Não foi isso que ele falou que nos distinguiria como discípulos dEle? Ele disse que qualquer um pode amar quem é bom e faz o bem (Mateus 5:43-47), mas só o cristão, através do poder sobrenatural da Graça de Deus, pode amar os inimigos e querer o bem para quem o fez mal.
Mesmo depois de cumprir o que Deus mandou, Jonas ainda ficou furioso com o Eterno. Imagino a cara emburrada e o bico do profeta. Ele conhecia Deus e sabia que o Senhor é rico em misericórdia.  Jonas ficou indignado porque os ninivitas se arrependeram e não receberam o castigo que mereciam. Deus, então, mandou uma planta para servir como abrigo ao patriota e ele desfrutou daquela sombrinha refrescante. No dia seguinte, um verme comeu a planta e Deus mandou um vento tão quente que fez Jonas quase desmaiar. Ele ficou tão indignado que declarou: “prefiro morrer a viver!”.
O Senhor ensinou ao profeta, através disso, que, se ele ficou com pena de uma planta que nem tinha sido obra de suas mãos, por que Deus não ficaria triste ao ver o povo de Nínive sofrer? O Eterno mostrou a Jonas o quanto ele estava sendo egoísta, preferindo a morte só porque não tinha mais sombra. Preferindo que milhares morressem só por causa de uma visão nacionalista, achando que o próprio umbigo era o centro do universo. O profeta estava indignado porque achava que seus inimigos mereciam sofrer ao invés de receberem perdão! Era por isso que ele não queria profetizar aos ninivitas! Essa foi a causa de ele ficar para a história como alguém que “fugiu de Deus”!
E quantas vezes somos assim? Achamos que somos os únicos que merecem as dádivas de Deus, pois nos achamos bons demais. Achamos injusto quando não vemos o sofrimento de alguém que nos fez sofrer. Onde está Deus? Será que Ele não viu meu sofrimento? Porque, então, ele não me honra? Esquecemos que somos o servo que devia muito ao Rei, mas que foi perdoado (Mateus 18:21-35) e acabamos não perdoando a quem nos tem ofendido, mesmo que essa ofensa sendo bem menor do que a nossa ofensa ao Eterno.
Porém, só quem tem noção da imensidão de sua dívida com Deus que foi perdoada é que consegue perdoar dívidas menores. Só quem se vê como um miserável indigno é que consegue estender essa graça a outros.

Que Deus me ensine isso. Que Ele me lembre sempre do quanto sou devedor, mas que nada mais consta nos Seus registros. Que o sacrifício de Cristo e o perdão imerecido estejam sempre em minha mente, para que eu possa caminhar por aí despejando graça sobre a vida dos meus devedores. Que eu possa tomar Jonas como meu companheiro, reconhecendo que até algumas figuras bíblicas têm a dificuldade de compreender o Eterno e seus caminhos. Que Jesus me ensine a abrir mão do que considero “justo”, para que eu possa, enfim, abençoar quem me fez mal.

Sentado debaixo da planta com Jonas,
Netto Britto

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